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Gustavo Badaró - As novas medidas cautelares alternativas à prisão e o alegado poder geral de cautela no processo penal: a impossibilidade de decretação de medidas atípicas* - Ano 2011

Por: Gustavo Badaró

Sumário: – 1. Introdução – 2. A regra da proporcionalidade e as medidas cautelares – 3. Novas medidas cautelares alternativas à prisão – 4. As finalidades das novas medidas alternativas à prisão – 5. A equivocada justificativa da medida atípica mais benéfica – 6. Legalidade versus poder geral de cautela – 7. Conclusões. 
1. Introdução

    A Lei n.º 12.403/2011 promoveu profundas mudanças no regime das medidas cautelares processuais penais de natureza pessoal. 
    Foram mantidas, e não havia de ser diferente, a prisão em flagrante, a prisão temporária e a prisão preventiva, bem como continua a subsistir a liberdade provisória, com ou sem fiança. Mas houve alterações importantes, seja mudando a natureza da prisão em flagrante delito e da fiança, seja alterando as hipóteses de incidência da prisão preventiva e caracterizando-a como uma medida cautelar pessoal excepcional. A grande novidade, contudo, foi a eliminação de um insuficiente sistema bipolar de medidas cautelares pessoais, que funcionava apenas com os extremos opostos da prisão preventiva e da liberdade provisória.
    Com a recente reforma das medidas cautelares, o Código de Processo Penal passou a prever, entre os extremos acima mencionados, medidas alternativas: “comparecimento periódico em juízo” (art. 319, inc. I), “proibição de acesso ou frequência a determinados lugares” (art. 319, inc. II), “proibição de manter contato com pessoa determinada” (art. 319, inc. III), “proibição de ausentar-se da Comarca” (art. 319, inc. IV), “recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga” (art. 319, inc. V), “suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira” (art. 319, inc. VI), “internação provisória do acusado imputável ou semi-imputável” (art. 319, inc. VII), “fiança” (art. 319, inc. VIII), “monitoração eletrônica” (art. 319, IX) e “proibição de ausentar-se do País” (art. 320).
    Antes, quando vigorava o reducionismo bipolar, argumentava-se, ante a inaceitável omissão legislativa, com a possibilidade de o juiz penal, aplicando por analogia (CPP, art. 3.º) o poder geral de cautela previsto no Código de Processo Civil, decretar medidas cautelares processuais atípicas, isto é, não previstas em lei. E, complementando-se tal raciocínio, fundamentava-se a necessidade de se socorrer de medidas não previstas em lei, in bonam partem, isto é, para beneficiar o acusado, pois, caso contrário, teria o juiz que decretar a sua prisão preventiva ou mantê-lo preso em flagrante delito.
    Agora, passou a existir um rol de medidas intermediárias entre a prisão cautelar e a liberdade provisória. Estaria, assim, de uma vez por todas, sepultada a discussão sobre a possibilidade de utilização do poder geral de cautela no processo penal? Uma resposta simplista seria: sim, pois agora passou a existir o que antes faltava! 
    Todavia, a questão exige uma análise mais atenta, mesmo que seja para chegar, ao final, à mesma resposta positiva. Isso porque, mesmo diante do novo catálogo de medidas alternativas, poder-se-á argumentar que o rol não está completo, que sempre poderão surgir novas necessidades de outras medidas alternativas, ou mesmo de ampliar a finalidade das novas medidas alternativas. Não é necessário, sequer, recorrer ao direito comparado. Basta comparar as novas medidas criadas nos artigos 319 e 320 do CPP pela Lei n.º 12.403/11 com o conjunto das medidas cautelares alternativas à prisão, previstas no Projeto de Lei n.º 156/09, para concluir que o legislador poderia ter ido além, estipulando outras medidas ou mesmo finalidades mais amplas às medidas recém criadas. 
    O objeto do presente estudo é, pois, verificar a possibilidade ou não de o juiz aplicar no processo penal o chamado poder geral de cautelar e decretar medidas cautelares atípicas, mesmo diante das inovações da Lei n.º 12.403/11, que alterou os artigos 319 e 320 do Código de Processo Penal, criando várias medidas alternativas à prisão preventiva.